sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Ele chega a casa numa sexta. Larga as malas e cai na cama, ainda vestido, sem a minima vontade de se mexer para seja o que for. É só uma semana, lembra-se. Mas aquele pequeno "só" destoa na frase, uma semana da sua perspectiva distorcida parece uma eternidade.
Acorda no sábado antes das 7 da manhã, toma um duche rápido, veste qualquer coisa simples e confortável, hoje não lhe interessa parecer bonito, tal pensamento nem sequer lhe passa pela cabeça. Sai, toma um café, faz compras para a semana e volta para a cama.
Passa o dia a dormir, prepara um jantar que supostamente deveria ser especial, mas o dia parece-lhe igual a todos os outros, a monotonia instalou-se e a quebra para ela ainda está a muito tempo de chegar. Sonha com ela, apesar de não se conseguir recordar dos pormenores quando acorda.
Passa a semana entre as aulas, um qualquer mundo de fantasia onde as coisas parecem um pouco menos negras e a cama. Dorme muito. Detesta dormir, mas detesta ainda mais o tempo em que tem que estar consciente, acompanhado pelas sombras e as memórias.
Tenta sobretudo não pensar nela. Afasta-a deliberadamente do pensamento das inumeras vezes que ela lhe surge como uma luz que afasta tudo o que o preocupa. Não pode dar-se ao luxo de pensar nela. Pensar nela implica lembrar-se que está longe demais dos seus braços, do seu sorriso, dos seus beijos ardentes, do calor do seu corpo esbelto.
Chega finalmente o final da semana, a tão esperada sexta feira, e ele pensa que tudo está finalmente bem, pode por fim estar com ela, pode permitir-se pensar nela, quando recebe a noticia.
As palavras surgem numa janela do monitor que é ignorada durante mais de meia hora, porque agora está apenas a umas horas de poder voltar a tê-la nos braços. Quando finalmente a abre descobre que afinal o seu companheiro de viagem resolveu adiar para a semana seguinte a visita á quinta. Merda, nada pode correr bem para variar? Ele até se tentou esforçar, forçou-se a cumprir os seus deveres, a não cair na depressão. Merece uns dias de paz, mas estes sem que ele tenha culpa escapam-lhe por entre os dedos.
Faz um telefonema, explica o que se passou.
Afinal faz falta lá. Afinal depositam-lhe o dinheiro para voltar. A familia, apesar de tudo o que ele possa pensar, ainda se preocupa com ele. Ainda não desistiram dele. "Vem, passa o fim de semana connosco. Queremos estar contigo, precisas do nosso apoio."
Sim, precisa. Mas não é o apoio da familia que ele quer. É o conforto dos braços dela. Sente-se mais aliviado agora. Pensa em mandar-lhe uma mensagem, avisá-la. Não o faz, tal como acabou por não o fazer nas inumeras vezes durante a semana em que ficou à janela, de telemóvel na mão a pensar em tudo o que lhe queria dizer, acabando por o abandonar em cima da cama e sair para um passeio inutil que apenas serve para pensar demais. Talvez o pai tenha razão. Talvez ele não devesse ficar sozinho. Ele não quer estar sozinho, mas ao mesmo tempo também não quer estar com ninguém que não seja ela. Na impossibilidade de tal desejo ser realizado refugia-se em sonhos, drogas e mundos de fantasia.
É sexta. Acabaram-se as drogas. Não há tempo para dormir e sonhar, ou para se alienar noutros mundos. É dia de preparar as coisas e voltar para junto dela.
"Tenho que a avisar que vou ter com ela."
Nota-se pela primeira vez numa semana um sorriso nos seus lábios.

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